10 de outubro de 2014

Anulação de votos: uma cidadania abstêmia.




By Kosmur  



Eu não entendo, por mais boa vontade que tenha, a manifestação de quem vai às urnas com o fim de anular o próprio voto. Como um cidadão pode deixar indefinida sua manifestação, enquanto permite que outros decidam em seu lugar. Parece que o indivíduo escolhe para si uma espécie de enclausuramento político, no qual encerra sua individualidade, prostrando a construção coletiva da cidadania.


Um projeto de democracia é uma construção comunitária, não-individualizada. A manifestação individual é a ação encadeada tendo por fim a comunidade. Por isso, não está isolada, é a substância de que se alimenta todo o mecanismo político de representação popular.


A levar-se em conta o descrédito moral como reação natural das demandas jurídicas relativas às acusações e condenações de corrupção no país, ainda assim, não creio que a abstenção, embora um direito, seja manifestação de cidadania.


Cidadania é participação positiva. É um dever de agir; a abstenção é uma pronta negativa ao dever de agir em prol da coletividade, é um ausentar-se do compromisso coletivo. A abstenção frente às urnas, ressalvados os casos de impossibilidade física e psíquica de manifestação política do votante, é inadequada ao exercício de responsabilidade política e de civismo.


By  Kosmur
E fico como que boiando na tentativa de investigar onde se pode mesurar a cidadania de quem a faz por mero desperdício. De que serve para mim, para ti, para nós, uma manifestação inexpressiva, uma expressão imanifesta? Ratifica o grupo da situação mantendo-os como aí estão? É um protesto de oposição à forma republicana de organização política e, assim, um conclame à nova constituinte? É um contraponto ao Estado Nacional, um convite à anarquia?...


No pleito, a expressão da minha cidadania pelo voto é, a um só tempo, direito, poder e dever. Direito, porque subjetivo, intangível e intransferível; poder, uma vez que somos os mandatários do exercício político de outrem; e um dever, haja vista ser uma obrigação que tange à consecução dos destinos de uma sociedade inteira, donde se insere aí o princípio da solidariedade social.


Será que os (mal)ditos cidadãos possuem consciência de que sua inexpressiva forma de agir é uma condescendência quanto ao que pretende protestar? Ou que sua tosca manifestação lhes retira da fisiologia deste macro-organismo político? Aliás, se por livre escolha me ausento do meu direito-poder-dever de manifestar-me no processo político, igualmente não me destino a reclamar quanto às situações decorrentes deste mesmo processo.


É uma questão de coerência moral. Portanto, anuladores de votos: no decorrer dos próximos quatro anos, abstenham-se também de reclamar! Deitados ermamente em berço esplêndido, assumam ao menos um único voto: o de silêncio. Sem mais.


By  Stefano











Nenhum comentário: