24 de fevereiro de 2016

Síndrome de Estocolmo no 'antifeminismo feminino'.





Estava pesquisando a Síndrome de Estocolmo em mulheres vítimas de abuso. O texto do link abaixo é bastante esclarecedor e alerta para pontos sensíveis de nosso atavismo cultural.


Só não concordo com a sugestão de que mulheres poderiam resolver-se com pessoas do mesmo sexo como forma de driblar sua heterossexualidade. Não creio que a coisa toda seja tão simplista. Necessário a referência e essa passa por uma condição que é marcadamente cultural.


Por outro lado, como o modus operandi masculino é largamente conhecido, nos desencoraja da possibilidade de muitos flertes por julgarmos NÃO VALER À PENA. Quando calculamos honestamente o ônus de manter um relacionamento com um homem em face de algum benefício partilhado, seja ele qual for, sexual, afetivo, moral, financeiro etc, é DESENCORAJADOR.


Eu me separei há mais de dois anos e a experiência foi agradável o suficiente para manter-me segura no muro da solteirice. Estar sozinha parece-me mais conciliável em não ter ameaçada a minha esfera de liberdade.


Recomendo texto por ser uma discussão sempre atualizada. Feminismo, um modo de olhar, de perceber e de agir. Uma vez feminista, não há modo de conciliar questões tão acintosamente veladas. Principalmente, porque já estamos cansadas de tanto!


O texto foi postado pela jovem Isabelle, tomando por base o Loving to Survive: Sexual Terror, Men's Violence, and Women's Lives - Dee L.R. Graham, conforme ela mesma cita. O título do blog dela é sugestivo: "Nós somos as mulheres sobre as quais os homens nos alertaram". <rsrsrs>


Seguem o link e alguns excertos retirados de lá: 




“compreendemos que as mulheres sofrem coletivamente da Síndrome de Estocolmo – a criação de vínculos de um refém com seus captores – como resultado do seu medo constante de serem assediadas verbalmente, sexualmente e fisicamente, bem como restringidas economicamente pelos homens.



”as mulheres se esforçam para agradar os homens, e dessa reação surge a “feminilidade”: a sua aparente subserviência, docilidade e auto-sacrifício.”



“A natureza aparentemente difundida desse fenômeno sugere que a criação de vínculo com o abusador (Síndrome de Estocolmo) é instintiva e desempenha uma função de sobrevivência para vítimas de abuso crônico.”



“Quando a vítima define a relação como de carinho, é fácil para o abusador fazer o mesmo. Obviamente, essas distorções cognitivas estão a serviço da sobrevivência: elas reduzem o terror, criam a esperança de escapar por via da conquista do abusador, e facilitam a criação de um vínculo entre o abusador e a vítima e, portanto, aumentam as chances de sobrevivência da vítima.”



“As distorções cognitivas proporcionam para as vítimas uma interpretação acerca de seu próprio comportamento. O conteúdo das distorções traz um significado para as vítimas sobre seu comportamento, e as ajuda a acreditar que estão no controle.”



“A vítima com frequência racionaliza o abuso ao se culpar pelo ocorrido, acreditando que pode controlá-lo e também quando é abusada. Mas por que ela se culparia por seu abuso? Há pelo menos duas razões:
(1) A fim de garantir a sobrevivência, a vítima adota a perspectiva do abusador, e esse acredita ter uma justificativa para abusá-la;
(2) Se a vítima se culpa pelo ocorrido, ela então acredita que é capaz de cessar o abuso. Outra conseqüência dessa distorção é a de que a vítima gasta uma energia imensa para mudar ou “melhorar-se” a fim de que o abuso termine.”



“A história e realidade das mulheres ao redor do mundo não deixam dúvidas de que os homens são capazes de matar mulheres, de usar violência para controlá-las socialmente, e que os homens utilizarão os motivos mais banais para racionalizar suas violências.”



“Pesquisando em diversas fontes, Russell (1984) identificou as funções do assédio sexual, que incluem:
·       A manutenção da prerrogativa masculina tradicional da iniciativa sexual.
·       A expressão da hostilidade masculina em relação às mulheres.
·       A compensação de homens pela impotência em suas próprias vidas através de controle sobre uma mulher.
·       Afirmação do papel sexual da mulher sobre suas outras funções, e, através disso, a manutenção das mulheres em posição subordinada.
·       A limitação do acesso das mulheres a cargos específicos, especialmente aqueles que não são “tradicionalmente” femininos.
Outra função do assédio é sexualizar a interação, comunicando às mulheres que somos, principalmente e antes de tudo, objetos para a satisfação sexual dos homens.”



“No entanto, as formas de violência mais freqüentes não são conceitualizadas como violentas, ou mesmo abusivas ou não-usuais pela maioria das mulheres. Infelizmente, elas são vistas como comportamentos masculinos normais, o que sugere que as mulheres conviveram por tanto tempo com a violência masculina que ela se tornou “imperceptível”.”



“Devemos igualmente destacar que todos os homens se beneficiam das consequências das violências e das ameaças de violência por outros homens.”



“Note-se que em troca de segurança física de terceiros e “liberdades”, a mulher deve se submeter sexualmente ao seu “protetor”, e, muitas vezes, ter e cuidar de seus filhos. O fato é que as mulheres pagam, e pagam caro, pelas pequenas “gentilezas” que recebem dos homens, inclusive a gentileza de protegê-las da violência de outros homens. Também se pode argumentar que o comportamento protetor dos homens em relação às mulheres é, na verdade, a proteção daquilo que entendem como sua propriedade.”



·       “Deus é retratado como sendo um homem, onipotente e superior, provendo legitimização “divina” às relações hierárquicas.
·       Nossa história é masculina, pois as vidas das mulheres foram apagadas de todas as representações oficiais, ou então reescritas a partir da perspectiva dos homens.
·       A baixa renda das mulheres em relação à dos homens pressiona as mulheres a casar ou permanecer casadas, tendo como objetivo sua sobrevivência econômica.
·       O padrão de uma mulher atraente é definido como ser pequena e magra (ou seja, fraca), e vestir-se de forma que não possa se proteger (por exemplo, usar salto alto).”



“Porém, dentre as gentilezas demonstradas, talvez a mais valorizada pelas mulheres seja o afeto e o amor de um homem. Frye (1983) oferece uma perspectiva interessante acerca do amor dos homens:
“Dizer que um homem é heterossexual implica somente que ele mantém relações sexuais [fode] exclusivamente com [ou submete sexualmente] o sexo oposto, ou seja, mulheres. Tudo ou quase tudo que é próprio do amor, a maioria dos homens hétero reservam exclusivamente para outros homens. As pessoas que eles admiram; respeitam; adoram e veneram; honram; quem eles imitam, idolatram e com quem criam vínculos mais profundos; a quem estão dispostos a ensinar e com quem estão dispostos a aprender; aqueles cujo respeito, admiração, reconhecimento, honra, reverência e amor eles desejam: estes são, em sua maioria esmagadora, outros homens. Em suas relações com mulheres, o que é visto como respeito é gentileza, generosidade ou paternalismo; o que é visto como honra é a colocação da mulher em uma redoma. Das mulheres eles querem devoção, servitude e sexo. A cultura heterossexual masculina é homoafetiva; ela cultiva o amor pelos homens.”  (...) De fato, propomos que o ápice da representação da subordinação da mulher e dominação do homem, e também um dos momentos nos quais o vínculo da mulher com seus abusadores se torna mais evidente, ocorre durante o ato sexual heterossexual.”



“Uma mulher exposta às idéias, opiniões, atitudes, sentimentos e necessidades dos homens (e filhos), ao ponto da exclusão às das mulheres, é uma mulher ideologicamente isolada. (...) Note-se que, uma vez que os homens ameaçam as mulheres com violências porque são mulheres, isto é, porque possuem corpos femininos, muitas mulheres depreciam seus próprios corpos e de outras mulheres, algumas delas ao ponto de odiá-los. Isso acaba por agravar ainda mais o isolamento entre as mulheres.”



“Dworkin (1985) oferece uma observação pungente: “O feminismo é odiado porque mulheres são odiadas. O anti-feminismo é uma expressão direta de misoginia; é a defesa política do ódio às mulheres. Isso se dá porque o feminismo é o movimento de libertação das mulheres.”



“O movimento feminista proporciona às mulheres um contexto que legitimiza falar das violências em nossas vidas previamente invisibilizadas – o incesto, estupro, espancamento e assédio que moldam nossos dias. Revelar a natureza pervasiva dessas violências expõe a falsidade dos mitos patriarcais de que tais incidentes são isolados.”



“precisamente ao manifestarmos nossa ética feminista, passamos a ouvir sobre a importância da tolerância. É preciso compreender que, quando as pessoas começam a falar sobre a importância da tolerância, altruísmo e auto-sacrifício, isso indica que elas percebem um conflito inerente de interesses entre os envolvidos. Dessa forma, a fim de resolver esse conflito, espera-se que aqueles que não possuem poder institucional sejam altruístas. Nesse sentido, o altruísmo e o auto-sacrifício são considerados “virtudes femininas”.



“Nós apresentamos todas essas observações a fim de que as leitoras possam determinar por si próprias se os homens como um grupo demonstram verdadeiro amor às mulheres. Senhores “gentis” de escravos podem ter tornado a escravidão relativamente mais suportável para os escravos, porém isso não fez da instituição da escravidão algo menos hediondo. Também não acreditamos que, sob condições de dominação masculina, o conceito do “consentimento” feminino em relações desiguais seja significativo.”




“Quanto mais vozes femininas se erguerem confirmando as violências dos homens, menos isoladas se sentirão as vítimas, e mais difícil será a minimização do problema pelo patriarcado. Da mesma forma, à medida que as mulheres, ao criarem vínculos entre si, receberem umas das outras o amor, a afirmação e a consideração necessários a qualquer ser humano, elas se tornarão cada vez menos dependentes das pequenas “gentilezas” dos homens para que sintam que possuem valor.”






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