14 de janeiro de 2016

Fé temerária, razão subtraída.



Touro, pintura de Johfra Bosschart.

Não vejo mal no exercício da liberdade altruísta. Por que temos que compreender a deidade como uma força impositiva? Por que não podemos exercer nossas ações e nossas vontades, considerando que delas resultam a satisfação nossa ou de muitas pessoas, sem que disso nos tornemos temerosos?


Não considero o temor a Deus uma virtude. É antes uma debilidade humana, não uma virtude. Por isso, sinto proximidade com a inquietude e a angústia que movimentaram muitos pensadores. Em alguns momentos, é a sensibilidade que me encanta; em outros, o próprio exercício literário é o que me agrada.


A argúcia de Schopenhauer. O destemor e a sensibilidade de Nietzsche. A soberba vocação para a inquietude de Unamuno. A clareza de Einstein cujos argumentos expõe para defender uma compreensão evolutiva da deidade.


Por que uma postura destemida deve ser considerada maligna?  A inclinação dessas questões não satisfaz um entendimento parcimonioso. Quando o exercício da cética como atitude elaboradora das convicções foi compreendida como instrumento do maligno? As indagações não são o ponto de partida na construção do conhecimento humano?



Percebo que, para a abastada maioria, o divino funciona como uma bengala, sem a qual não se pode suportar o peso de si mesmo. Mal e bem se equivalem na manipulação de elementos sagrados e elaboração de uma normatividade ritualística, impositiva para a conduta humana, voltadas à consecução de fins predeterminados. E é aqui o ponto no qual se distanciam, o direcionamento dos fins pretendidos.





Mas ponhamos desde logo o mal em evidência, em toda a sua diversidade: cada qual nele reconhecerá o que lhe diz respeito pessoalmente. Ao mesmo tempo, dar-te-ás conta de tudo quanto tens menos a sofrer deste descontentamento de ti, do que aqueles que, estando ligados por uma profissão de fé faustosa e ornando com um nome pomposo a miséria que os consome, teimam no papel que escolheram, menos por convicção que por questão de honra.
Sêneca, em resposta às inquietações de Sereno, “Da tranquilidade da alma”.










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